“Por que, afinal de contas, você está lutando na guerra dos concursos públicos?”Se fizermos essa pergunta para mil concurseiros sérios, teremos poucas respostas repetidas por muitos deles. Isso mesmo, não são muito diferentes os motivos que levam as pessoas a se submeterem a anos de estudo intenso e árduo, a uma rotina estressante de perseguir algumas dezenas de cargos públicos disputados por dezenas, centenas de milhares de pessoas, a enfrentar a cada dia a frustração, as pressões, a ansiedade, a deixar a vida pessoal de lado, adiar sonhos e decisões, tudo em nome de uma opção profissional.
Porque pessoas como eu e você fazemos isso?
Em meio a motivos nobres como “fazer minha parte para tornar o Brasil um lugar melhor para se viver” e “realmente contribuir para algo que não seja criar riqueza para pessoas que já não sabem o que fazer com a riqueza que já têm”, existe um motivo tachado como sórdido, imoral, mesquinho, menor, o “por dinheiro, para ganhar muito bem, e pela estabilidade do cargo, por dificilmente poder ser demitido”.
Você acredita que tem gente que não tem vergonha de afirmar de cara lavada e com o queixo levantado que está lutando na guerra dos concursos público exatamente por dinheiro e estabilidade?! Onde foi que chegamos? Que mundo é esse?
Eu, por mim, afirmo com todas as letras ...
EU LUTO NA GUERRA DOS CONCURSOS PÚBLICOS POR DINHEIRO, PARA GANHAR MUITO BEM, E PELA ESTABILIDADE DO CARGO, POR DIFICILMENTE PODER SER DEMITIDO.Vem cá, gente? O que tem de sórdido, imoral, mesquinho ou menor nesse motivo? Por que esse motivo é não só aceito como exigido no mercado de trabalho privado, onde recebe o nome resumido de ambição profissional, enquanto no mercado de trabalho público é pouco mais que um palavrão? A resposta é simples, culpa daquele ranço hipócrita que permeia a sociedade brasileira misturado com a velha crença de que servidores públicos recebem seus gordos salários para não fazerem absolutamente nada. Sejamos sinceros, a maioria dos concurseiros sérios estão nessa guerra exatamente por esse motivo. Não há pecado em querer e afirmar isso.
Analisemos melhor esse motivo, por partes, ao modo de Jack, o Estripador.
GANHAR MUITO BEM – Até alguns anos atrás, pouca gente com boa formação em termos de estudo topava trabalhar para a Administração Pública. Os salários eram muito mais baixos que os oferecidos pela iniciativa privada, e havia também o preconceito de que somente incompetentes que não conseguiam um lugar ao sol na iniciativa privada se submetiam a trabalhar para o Estado. Pois bem, a mesa virou. Hoje é a iniciativa privada que paga muito menos que a Administração Pública, que é onde os profissionais com melhor formação em termos de estudo se digladiam para conseguir uma vaga, que se tornou troféu e atestado de alta qualificação e competência, sobrando para os incompetentes que não têm formação e/ou capacidade para ganhar essa guerra as “vaguinhas” na iniciativa privada.
Vivemos numa sociedade capitalista de consumos. Temos sonhos e objetivos de consumo que mudam e se tornam a cada dia mais sofisticados e caros. A TV e a Internet nos abriu definitivamente as portas do mundo, não queremos mais ver tudo pela janelinha da TV, mesmo que seja de LCD e 42 polegadas, queremos embarcar em um avião e conhecer esses lugares pessoalmente, nadar em praias taitianas, comer em restaurantes parisienses, fazer compras em Nova York. Tudo isso custa dinheiro e custa caro, portanto precisamos ter ótimos salários para bancar a conta. Se o emprego público nos permitirá fazer isso muito mais rápido e facilmente que o emprego privado, é a chave que nos abrirá a porta desse mundo novo de consumo e diversão, então não há vergonha ou demérito em optar por ele.
O concurso público do TRT-SP está marcado, para o cargo de Técnico Judiciário a remuneração será de R$3.651,87, isso que está no edital, descontando benefícios não monetários e adicionais monetários que podem elevar esse valor em pelo menos 20%. Tenho amigos que trabalham como economistas há dois anos em bancos famosos da Avenida Paulista (São Paulo) que ganham exatamente isso e no mercado de trabalho são considerados como muito bem remunerados!
ESTABILIDADE DO CARGO, POR DIFICILMENTE PODER SER DEMITIDO – O mercado de trabalho, assim como qualquer mercado de outras commodities, tem como base o mecanismo da oferta e demanda. Quando oferta de mão de obra está mais alta que a demanda por parte das empresas, os patrões têm liberdade para pagarem menores salários e podem escolher a vontade entre os interessados em lhes prestar serviço. É exatamente isso que está acontecendo hoje, é muito mais gente procurando emprego do que a quantidade de vagas disponíveis.
Um aspecto vil desse momento da economia está na instabilidade das relações de trabalho. Como há mão de obra de sobra no mercado, os patrões podem tranqüilamente dispensar trabalhadores que tenham contratado, para contratar outros trabalhadores mais qualificados e/ou que aceitem trabalhar por menores trabalhos e/ou menores benefícios. Literalmente quem está empregado termina a semana sem saber se na semana seguinte continuará empregado. É viver com uma espada dependurada sobre a cabeça, qualquer hora ela pode cair e lá estará o cara engrossando as estatísticas de desemprego.
Esses amigos economistas que trabalham nos bancos da Avenida Paulista vivem reclamando disso. Os caras vivem com gastrite de tanta preocupação, tensão e medo de serem demitidos. Eles sabem que se contrariarem seus chefes, poderão ser demitidos rapidamente. Eles sabem que se não trabalharem até altas horas da noite, em finais de semana, abrir mão de férias, ir trabalhar mesmo doentes, aceitar humilhações de chefes imbecis, tudo isso, eles também poderão ser demitidos rapidamente.
Sinceramente, gente, isso não é vida!
Agora, no emprego público existe a famosa estabilidade. Ao contrário do que muita gente pensa, não significa que o servidor público não possa ser demitido, não é isso. A estabilidade existe para evitar que os servidores públicos sofram pressões políticas para agirem desonestamente dentro de suas atribuições profissionais, como no caso de algum político (deputado, prefeito, ministro, ...) forçá-lo a fazer vista grossa a um desvio de verbas sob a ameaça de demissão. Por isso mesmo, o processo de demissão dos servidores públicos segue regras claras e somente pode acontecer em casos específicos, tudo determinado em lei.
Agora, quem vai dizer que não é ótimo não se preocupar em contrariar um chefe que exige que o cara trabalhe vários dias além do horário normal de trabalho, nos finais de semana ou mesmo doente, unicamente por medo do cara não gostar e apelar para a demissão?! Quem não trabalharia muito melhor e mais tranqüilo sabendo que o chefe não gostar da cor dos seus olhos, da sua pele, ou do seu sotaque não será motivo de demissão por algum motivo ridículo como “corte de verbas”?!
Concurseiros sérios não podem, de modo algum, achar ou mesmo pensar que entrar no serviço público será algum tipo de semi-aposentadoria muito bem paga. Nada disso. Os servidores públicos vêem sendo cada vez mais exigidos em termos de competência e eficiência. Ou você acha que o Governo está disposto a pagar salários tão bons para empregos estáveis para nada? Muito pelo contrário, é para atrair e manter os melhores profissionais, os mais bem qualificados, os que melhor se prepararem, mostrarem fibra e persistência para vencer a guerra dos concursos públicos.
Eu quero um Brasil melhor e quero agora, não para apenas meus netos aproveitarem. Sou filho de Deus, mereço viver em um país melhor antes de morrer. E se posso ajudar a fazer isso acontecer trabalhando diretamente nessa grande obra e ainda por cima ganhando bem sem medo de ser despedido por um motivo besta qualquer, então estou nessa guerra de corpo e alma, pra ganhar!
Resumo da ópera – Nunca mais tenha receio ou vergonha de dizer que está lutando na guerra dos concursos públicos porque você quer ter um ótimo salário e estabilidade no emprego. Isso não é feio, não é motivo de vergonha, muito pelo contrário, é ser honesto e honrar sua luta. Por isso digo, mercenário é quem se submete a chefes em empresas privadas que não estão nem aí para seu bem estar, apenas para os lucros da empresa, porque não têm coragem de enfrentar a guerra dos concursos públicos!